sexta-feira, 29 de fevereiro de 2008

Papel de parede

Todos já se pegaram prestando atenção para algo insignificante, alguma coisa que passa despercebida pela civilização, e de repente aparece ali, com todas suas formas, cores e cheiros, como se fosse uma revelação. E assim nos pegamos prestando atenção em coisas banais.
Assim era Jorge, uma pessoa como eu e você, na verdade mais como eu, pois eu o criei. Mas isso não vem ao caso, o caso é que ali estava Jorge, sentado na sala de sua namorada atual, quando teve uma epifania. O papel de parede definia a pessoa. Ficou observando o papel de parede da casa de sua namorada, analisou, analisou e decidiu que definitivamente a personalidade dela não combinava com a dele. Resolveu terminar o namoro.
O tempo foi passando, e mania por papel de parede tornou-se uma obsessão, e nenhum relacionamento passava do momento em que a moça o convidava para entrar e beber algo.
Assim foi seguindo sua vida solitária, ate que aos trinta anos conheceu Lurdes.
Lurdes era tudo que ele sonhava como mulher, só tinha um problema, nunca o convidara para entrar em casa. Assim Jorge morria de curiosidade para ver o papel de parede de Lurdes, e confirmar se tinha encontrado com sua alma gêmea. O tempo foi passando e quando tinham 6 meses de namoro, Lurdes o convidou para entrar. Finalmente ele veria o papel de parede. Porem quando entrou na casa, surpreendeu-se, as paredes não tinham papel. Jorge foi ao delírio. Pediu Lurdes em casamento na hora, ali estava uma pessoa que poderia ser moldada de acordo com suas vontades, ele poderia colocar o papel de parede que quisesse impor seu ritmo, enfim controlá-la.
E hoje após dez anos de casados, Jorge ainda se lembra do dia em que pediu Lurdes em casamento, fica pensando, pensando, mas não pode pensar muito tempo, porque a Lurdes logo o chama. Está na hora dele passar a roupa...

Estranho Amor

Era uma vez em um reino encantado e distante, uma bela princesa das fadas, cheia de charme e sempre vestida para matar. Era desejada por todas as criaturas do reino mágico, fossem outras fadas, ogros, lobisomens, ninfas, ou o que seja. E ela se sabia desejada e, portanto,caprichava a cada vez que precisava de um favor, de um encanto novo ou de um serviço que sabia que não iria realizar, também governava desta forma, seduzindo a todos com sua beleza.

Em um dia estranho, com o sol nascendo prateado e a noite virando dia, a nobre princesa resolveu passear, com seus delicados sapatos brancos e vestido singelo, com um decote que faria uma rameira das docas corar. Em sua caminhada, ela não percebeu que alguém a espreitava, cheio de desejo e excitação, um belo unicórnio mas com uma índole terrível e irascível.

Em sua mente, o quadrúpede só pensava em amar a bela donzela e só não tinha tomado alguma decisão por uma questão biológica, perguntava-se como iria amar a pequena fada, dada a diferença de dimensões entre os corpos o que impossibilitava de certa forma o ato carnal. Independente disso, a amava mais do que tudo e resolveu seqüestra-la enquanto imaginava um jeito.

Uma vez seqüestrada, a pequena fada esperneou de todas as maneiras, contra os modos abusados do animal e contra o mau cheiro do castelo para o qual ele a levou que cheirava como um estábulo. E o unicórnio passou dias, semanas, meses e anos tentando de todas as formas suplicar para que ela se casasse com ele, discorrendo sobre suas boas intenções, perfumando mais a casa e comprando presentes caros e inúteis. Só que a pequena fada se ressentia cada vez mais, motivo que se explica pelas janelas sempre fechadas do castelo e sua presença sempre ser escondida de criados ou outros habitantes. O unicórnio procurava evitar a todo custo que outros soubessem de seu pequeno roubo.

Mas nenhuma fortaleza ou quarto é inexpugnável e quando o unicórnio partia, pequenos ratos se enfileiravam para admirar a bela fada e logo começou a se espalhar seu paradeiro. Estes boatos chegaram até o grande rei dos gnomos, que ao contrário da doce fada, era feio de doer, acostumado a submeter todos pela feiúra e pestilência que exalava e ele queria um pouco de beleza ao seu lado.

Armado e preparado para percorrer as sombras, o Gnomo conseguiu invadir o castelo do unicórnio, resgatar a fada e sair sem um arranhão que fosse, levando-a para sua morada subterrânea. Chegando lá, ele a pediu em casamento, encantado com sua beleza e feliz por um pequeno raio de sol estar ao seu lado. A princesa que odiava a feiúra e a escuridão, uma vez mais sentiu-se contrariada, se recusando a comer ou a casar com o rei estranho.

Sentindo-se ofendido, o rei Gnomo tratou de devolve-la ao unicórnio, que infeliz com toda esta situação, resolveu que provaria o sangue da fada. Chegou sorrateiro e a apunhalou, com alegria por ter do um fim prático ao rancor que guardava em seu coração. Mas o unicórnio ainda se sentia sozinho, desesperado pela solidão e pela sordidez de seus atos, buscou os conselhos do rei gnomo que também estava triste.

Em momentos de dificuldade, pessoas estranhas se juntam e descobrem novos sentimentos que até então permaneciam escondidos pela ignorância ou medo da reação de outras pessoas. Os dois descobriram que se amavam, casaram-se duas luas depois e são felizes até hoje.

quarta-feira, 27 de fevereiro de 2008

Piedade!

Eram cinco da manhã e Zé ainda não tinha conseguido dormir. Apesar de o banco duro apertar suas costas sentia-se confortável, afinal não era a primeira vez que ele dormia ali. O céu estava limpo e a luz da lua somava-se a da cidade tornando o céu claro e piscante. O vento frio da madrugada acariciava seu corpo arrepiando sua pele e fazendo flutuar docemente como uma dança os seus ralos cabelos que ainda insistiam em ficar presos em sua cabeça. Puxou o cobertor deixando apenas seu nariz gelado e úmido exposto.. Cinco e meia e o frio ainda persiste. Zé fecha os olhos e deseja que o dia chegue logo, seus dedos já estão amortecidos e ele aperta os joelhos com força. Agora é cinco e quarenta e cinco o dia está chegando, o manto azul do dia começa a se fundir com o negro da noite dando ao céu uma coloração de azul intenso. Uma névoa fria e úmida cobre o solo. Zé não agüenta mais o frio. – Por favor, meu Deus me traga um pouco de calor eu imploro! Não agüento mais! – pensou. Passos furtivos são percebidos, seria um anjo acolhedor trazendo boas novas do criador? Zé não ousa olhar e espera pacientemente sua graça, tudo foi muito rápido! Apenas um derramar de álcool e um riscar de fósforo e Zé finalmente ficou livre – obrigado Deus

domingo, 24 de fevereiro de 2008

Pendurado

Estava muito cansado, mais do que nunca havia estado e, por conta disso, pretendia uma inovação, uma transformação que fosse. Passava seus dias e suas noites aguardando uma chance do destino e ao mesmo tempo tinha medo.

O medíocre e o patético se atemoriza diante de novas perspectivas, anseia por elas mas ao mesmo tempo as sabota, consciente e inconsciente sabe que não as quer. Vive sua vida cretina, sente dor mas é covarde. Incapaz, se refugia em fantasias acreditando que um dia possam ser atingidas mesmo sabendo que não são.

Entretanto, ele estava determinado a mudar algo, apostar na fortuna independente de ter qualquer estratégia. Pensava ele, já que a vida física não me satisfaz, tentarei a metafísica.

Preparou a corda com carinho e amor, assobiando e cantando, como uma criança impressionada com sua própria sagacidade. Não se dignou a deixar carta ou o que fosse aos seus próximos, afinal, não os tinha. Subiu em uma cadeira, amarrou sua corda na janela de seu apartamento e saltou com o pescoço na outra ponta.

Ficou suspenso graciosamente e expirou sem dificuldade, enquanto vizinhos e pedestres da rua gritavam.

A Cuca

sábado, 23 de fevereiro de 2008

Sem sentido?

Já passavam das oito horas da noite, o metrô estava lotado, e ainda faltavam três estações. Seu coração batia acelerado, seu corpo começa a dar sinais de que ia deixá-lo na mão. Seria a segunda vez naquele mês. Não agüentava mais isso, seu corpo parecia estar ficando doente, sua mente sentia-se aprisionada dentro daquele corpo inútil. Precisava de sangue, pensava. Olhava as pessoas em volta com um misto de terror e desejo que começou a assustar as pessoas que prestavam atenção nele. Suava, sua mão tremia. Finalmente chegou sua estação. Desceu rápido e pôs-se a correr em direção de casa. Chegando, foi direto para cozinha. Abriu a geladeira, pegou um pedaço de carne crua e cravou-lhe os dentes. O gosto de sangue junto com aquele cheiro de geladeira o deixaram enojado, seu estômago embrulhou. Cuspiu, limpou a boca e ficou uns minutos controlando a ânsia de vômito. Recuperou-se, pegou um copo de leite, colocou duas colheres de Nescau e foi ver televisão. Amanhã tentaria de novo. Um dia, pensava ele, ainda consigo...

quarta-feira, 20 de fevereiro de 2008

Dois elefantes incomodam...?

Era inacreditável! A cidade que nunca parava, agora ficava atônita para o acontecimento. Em meio à pista expressa um casal de elefantes andava a passos vagarosos segurando logo atrás os carros, lembrando uma artéria entupida por dois grandes nódulos de gordura. Do alto em um helicóptero, um repórter segurava o microfone e olhava para baixo cuspindo palavras em um frenesi - é uma loucura! Temos que tirar os elefantes de lá. O corpo de bombeiros foi acionado, duas viaturas vermelhas e uma amarela param logo a frente dos paquidermes. Da amarela sai um homem alto de jaqueta bege que se ergue na frente dos animais e com as pernas espaçadas e as mãos na cintura, como um astro de bang bang. Ele olha fixamente para os animais. No peito duas inscrições: Rosalvo; zoonoses. Um outro homem sai pela porta lateral da viatura amarela e entrega ao nosso Clint Eastwood uma enorme espingarda. Rosavaldo abre o cano e coloca delicadamente dois projéteis em forma de seringa. Vira para o lado e sorri com ironia - estes derrubam até elefante - disse. Ele mira, mas os animais continuam impassíveis e continuam a caminhar devagar. Um rapaz magro com óculos extremamente grossos comenta com o colega - Cara parece aquele filme, o Império Contra-ataca, manja? Osvaldo levanta o rifle à altura dos olhos e mira no elefante da direita. Do alto o operador de câmera do helicóptero dá o zoom, em baixo as pessoas saem e se posicionam para ver melhor o espetáculo. Milhares de pessoas acompanham pela televisão a locução emocionada do apresentador do programa diário. Nas escolas as crianças descem ao pátio, os médicos param suas consultas e acompanham pelas telas espalhadas pela cidade, o taxista aumenta o volume do rádio. A cidade se conecta, tudo no tempo e no espaço se converge ali, naquele momento. Nada mais importa, a cidade parou. A respiração de todos entra em harmonia com a de Rosalvo. Ele atira. O projétil penetra na carne gorda do animal, ele levanta a tromba ao alto e empina. Seus olhos se transformam e assumem uma cor avermelhada e fixa, ele pisca e os olhos lacrimejam, as pálpebras se fecham e ele tomba. Sem demora, Rosalvo mira no segundo elefante e dispara, o sucesso é o mesmo, a multidão aplaude o nosso herói. Rosalvo sorri, ele ficou famoso. Nunca com seu mísero salário de 900 reais ele conseguira comprar um horário na TV só para ele. Agora ele tem a fama, momentânea que fosse, só para ele e para os dois elefantes. Mais tarde uma carreta aparece e retira os animais que são levados ao zoológico onde estão até agora. Para o resto de nós sobra apenas a felicidade de vivermos nossa vida repetida e medíocre seguindo uma cidade que não para, pelo menos até dois elefantes aparecerem em nossa vida.

terça-feira, 19 de fevereiro de 2008

Questão

O que Fidel irá fazer?

a) Passar uma temporada em Miami
b) Fazer compras em NY
c) Viajar com o Lula
d) Fazer campanha da coca-cola

Achmed - The Dead Terrorist

segunda-feira, 18 de fevereiro de 2008

Conversa entre amigos

- Anátema! Isso é um despautério! Onde já se viu alguém se jactar por tão infame paspalhice.
- E por que não haveria de fazer?
- Porque está mais que claro que não passa de uma coisa mexinflória.
- Até acredito que seja próximo disso, mas não tiraria todo o mérito do fato.
- Será que você não percebe o indubitável? Ou será que terei de lhe explicar de forma paulatina?
- Sim, seria bom, até para que não sobrasse nenhuma arrepsia sobre o caso.
- Deixe então lhe dilucidar a questão.
- Encete!
- Observe a questão com atenção e perceba a estultificação do sujeito. Ele começou de forma até que simplória, mas eficaz, depois durante os meandros de sua explanação ele malogrou. O ponto fulcral foi quando ele colocou o creme de leite.
- Eu gosto de creme de leite.
- Sim, disso eu sei, mas não combina.
-Eu acho que você está sendo irascível demais.
- Não combina e ponto. Não me venha com essa de que gosto é gosto e não se discute, porque já te falei sobre a estética.
- Me lembra uma coisa?
- Lembro sim. O que seria?
- De nunca mais te convidar para assistir programas de culinária. A menos enquanto você estiver fazendo letras.
- Não é letras, é Letras Clássicas e Vernáculos!
O outro deu com os ombros e foi andando em direção a televisão, no curto caminho, pensou quão doce seria ter a televisão na cozinha, uma vez que estaria mais perto das facas.


Guia de leitura e explicações:

Imagine a cena, com o primeiro indivíduo com ar superior e fazendo cara de nojo e expressões corporais. Já o segundo interprete-o de forma irônica e com um quê de desprezo quando fala as palavras mais rebuscadas, acrescente um olhar do tipo implorando para o outro ficar quieto.
Caso queira, imite os dois na frente do espelho, quando conseguir fazer isso estará perto da cena real.
Nomes omitidos e situação levemente modificada para preservar as imagens dos atores.
Nenhum animal racional, ou não, foi molestado, queimado, torturado,seviciado ou qualquer coisa bizarra que passe pela sua mente, durante o diálogo.
Baseado em fatos reais.

O autor.

domingo, 17 de fevereiro de 2008

Balada

Adriano havia sido arrastado por seus amigos a uma balada, lá, segundo eles, ele poderia desfrutar de alguns prazeres da juventude, como beber, encontrar mulheres, ou quem sabe: até mesmo beijar.

Ao chegar ao local, percebeu as músicas que tocavam, as pessoas que lá freqüentavam e não se sentiu parte daquilo, as pessoas pareciam vazias, meros bonecos de carne que se sacudiam de um lado para o outro. As mulheres não o olhavam, parecia que ele não existia, ou se existia, era algo bem estranho e digno de ser ignorado.

Descontente com a situação em que se encontrava, Adriano procurou uma cadeira onde se sentar, de frente as pessoas que passavam por ele, contemplando o grande nada que estava a sua volta. Sentado com os braços para baixo, imaginou seus punhos se abrindo e vertendo sangue, que jorrava de um vermelho escuro, quase negro. O liquido aumentava a cada momento, circulando ao redor da cadeira onde estava sentado, já não existia som algum, apenas o piscar de luzes e imagens que se moviam ao seu redor.

Tudo que conseguia imaginar era o fim das pessoas a sua volta, da maneira que fosse, desde que deixassem de respirar e sangrassem junto.

quinta-feira, 14 de fevereiro de 2008

terça-feira, 12 de fevereiro de 2008

Cavalo de Fogo



Para meus amigos fofos! (Marcos, Chinês e Luiz) :P

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Sentado na cama, olhava para fora da janela. Seus olhos azuis fitavam além do horizonte. A barba por fazer lhe dava um aspecto doentio. Sua boca permanecia entreaberta, e dela escorria um fio de saliva que já formava uma pequena poça no chão. O quarto, pequeno, cheirava a éter.
- Coitado, disse a enfermeira balançando a cabeça.
- Ele ficou catatônico depois da lobotomia, disse o auxiliar que estava ao lado da enfermeira.
Fecharam a porta, não antes de apagarem a luz.

domingo, 10 de fevereiro de 2008

Cena de Domingo

Nada mais havia para fazer, tudo estava acabado, os restos jaziam no canto. Respingos por toda parte davam a cor avermelhada ao local. Seus olhos cheios de lágrimas fitavam aquela cena triste, desolada, o fundo branco destacava-se, ossos empilhados com aspectos de ruídos acabavam de compor a cena.
Ele olhava, respirava fundo, estava cansado, o trabalho foi árduo, seu corpo pedia descanso.
Bebeu um pouco de água e deu uma olhada geral na paisagem ao redor. Foi quando percebeu que ainda restava a sobremesa.
Então sorriu.

A Bela Cidade

Com a espada desembainhada e sentado em uma calçada, um bérbere escrevia na areia que se acumulava na sarjeta. Com precisão e destreza deixando a desejar, contabilizava as vidas que havia ceifado naquele dia. Visualizava os rostos, os olhos, as expressões de cada um que tinha encontrado, fossem mulheres idosas, crianças, animais domésticos ou guerreiros já feitos.

No alto tudo que se via era a enorme coluna de fumaça, fruto do incêndio que consumia a antiga e orgulhosa cidade, que agora se mostrava escancarada, aberta aos saqueadores e vencedores. Mas o bérbere não se mexia, algo lhe faltava, a batalha tinha sido seu objetivo com combates justos contra adversários formidáveis, mas não havia sido o que havia encontrado. O início do dia fora promissor, com a invasão das muralhas, a grande escalada que os permitiu entrar na cidade e tomar posse. Contudo, ele imaginava que aquela havia sido sua hora de lutar de maneira brilhante e como uma estrela cadente, morrer no instante seguinte em meio à glória.

O Destino não havia sido generoso, sobreviver significou compactuar com o que veio a seguir, com o massacre e a violência contra não guerreiros, pessoas fracas que imploravam por suas vidas. Sentado ali, ele pensava em uma forma de espiar seus atos, de pôr um fim digno a uma vida que passado o momento certo de morrer, era agora vazia de propósito e pervertida pela ganância e baixeza. Sabia-se morto, não fisicamente, mas em sua própria essência.

Com o cansaço e a falta de ter o que fazer, dormiu no mesmo lugar, sobre a contagem de corpos que esboçara. Na sarjeta, sonhou com liberdade, com belas mulheres e com a benção do Altíssimo chegando até ele.

Acordou ainda com a lua no céu, o que o deixou encantado com a beleza das inúmeras luzes que agora podiam ser vistas com a fumaça sendo levada pelo vento. Os gritos já tinham cessado e a cidade ainda era bela e cheia de luz. As torres semi-destruídas, as construções ainda não inteiramente saqueadas, tudo aquilo era belo e ele queria ter feito parte de sua vida. Sua admiração pelo que havia destruído tornava sua situação dolorosa, muito além do que ele podia.

Tomado pela vergonha não levou nada da cidade que ajudara a conquistar, voltou com sua própria espada, elmo e malha, sujo de sangue e de poeira. Preferiu manter-se no acampamento do lado externo, onde o cheiro de sangue e fumaça era menos intenso.

sexta-feira, 8 de fevereiro de 2008

quinta-feira, 7 de fevereiro de 2008

Sobre a Fauna

Essa série é a ilustração dos animais que perambulam pelo meu quarto.
:p

Fauna 2




quarta-feira, 6 de fevereiro de 2008

domingo, 3 de fevereiro de 2008

Novo Desafio

Armando era um cara legal, desses com quem você pode passar uma noite inteira conversando sobre amenidades, sem perder o interesse ou sentir-se entediado. Trabalhava em uma pequena loja de brinquedos, das poucas que ainda restavam pela cidade, 10 horas por dia, em uma labuta sem fim. Sua ocupação fora da loja era beber sentado em qualquer botequim, colecionar selos e pintar.

Nos últimos 5 anos mudou de companhia regularmente, poucas eram as que agüentavam suas manias, indecisões e paixões. Explicar a uma mulher o motivo pelo qual tinha praticamente dobrado o turno na véspera do natal e em seguida encontrar-se com os amigos para uma boa cerveja, tinha sido o fim de seu último relacionamento. Contudo, continuava esperançoso e feliz, aguardava de forma paciente por uma nova oportunidade, uma nova mulher para tornar seus dias mais doces.

Ao final de mais um dia de trabalho quase ao encerrar seu expediente, uma última cliente se aproximou do caixa. Era alta, cabelos escuros e sorriso perfeito. Armando logo notou a beldade que estava próxima a ele, mas irritado por saber que não tinha a menor chance, tratou-a de forma seca e áspera. Ela como resposta apenas olhou em seus olhos de forma tensa, sem entender o que ocorria.

Sentindo-se desafiada pela postura de desprezo e agressividade que Armando emanava, ficou intrigada, como alguém que se sabia tão bela podia ser ignorada por um reles atendente de loja? Decidida a reverter a situação, ao pagar sua conta, passou a fitar seus olhos e fez questão de toca-lo ao receber os pacotes. Como forma de criar um vínculo que fosse, se despediu de maneira pouco formal pedindo que ele a chamasse de Laura.

No dia seguinte, a caminho do escritório, ela se olhava no espelho do elevador - cabelos presos em um coque, meia fina, salto baixo e Tailleur, sentia-se impecável. Sorriu para si mesma e passou a manhã inteira com a lembrança de que algo, ou melhor, alguém tinha surgido para ela no dia anterior. A atitude de desprezo tinha quebrado sua aparente frigidez, demonstrada a tantos homens diariamente.

Laura era advogada, solteira e capaz de contar nos dedos de uma só mão a quantidade de vezes que havia se interessado realmente por alguém. Vivia sozinha em um pequeno apartamento com suas flores. Amava mais do que tudo a liberdade que tinha e procurava mantê-la a todo custo, e por conta disto seus últimos relacionamentos haviam naufragado. Sabia-se bonita e por diversas vezes se utilizava dessa beleza para que portas fossem abertas, pneus trocados, pintura nova, entre outras coisas. Mas nos últimos tempos sentia-se triste, a solidão e a falta de perspectiva amorosa a tinham tornado mais apática.

Suas visitas à loja tornaram-se freqüentes, com Armando que ainda se recusava a acreditar que qualquer coisa fosse possível e com as investidas de Laura cada vez mais fortes. Depois de seguidas visitas e Armando ficar sem entender por qual motivo ela continuava freqüentando a loja, Laura ficou decepcionada ao perceber que era outro vendedor que atendia, que Armando não estava ali, ao menos aparentemente. Quando já se preparava para sair, viu seu objetivo sair atrapalhado do estoque, carregado com mil caixas diferentes e um mau humor aparentemente demoníaco.

Armando mal dormira aquela noite, desejava aquela estranha mulher e se excitava todas as noites pensando em tornar crível uma fantasia que sabia impraticável. Tinha saído da loja pensando em alguma forma de entrar em contato com ela, só não sabia como. Usar o cadastro da loja para ligar para alguém parecia insano, o vexame de que ela não se lembrasse dele ou da loja, até mesmo a falta de um sinal por parte dela de interesse, tornavam proibitivas quaisquer formas de contato. Mas logo ele a viu, fechou seu semblante e se preparou para alguns momentos de muda tentação, de se mortificar com a excitação e atração que ela exercia sobre ele.

Os dois estavam meio constrangidos ao se cumprimentarem, desejos mudos aturdiam os dois naquele momento. Ele a ajudou a escolher uma lembrança que ela dizia ser para sua sobrinha, sem desgrudar seus olhos dela ou de alguma parte que a pertencia por um segundo que fosse. Laura decidida a provar para si mesma ainda ser capaz de exercer domínio sobre outro homem, decidiu avançar, roçando por cima da calça a excitação de Armando, que sem entender bem o que fazer, simplesmente a puxou para o estoque.

Juntos, se livraram das roupas de forma rápida, se entregando a uma luxuria que estava represada desde o primeiro momento em que se olharam. Com as mãos apoiadas na parede, Laura se sentiu possuída e feliz por sentir que ainda era desejada, quanto a Armando, agia por puro instinto, mesmo sem saber o que acontecia.

Os dois chegaram ao clímax sem conseguir conter os barulhos decorrentes. Saíram separados do estoque com um pequeno intervalo entre os dois. Mesmo assim não conseguiram disfarçar certo constrangimento ao se deparar com fregueses ou outros funcionários da loja.

(Continua)