quinta-feira, 31 de janeiro de 2008

Consciência

O que fazer? Que caminho tomar? Esses eram seus pensamentos, indecisão era uma constante. Não sabia também o que levar e como ir, qual seria a trilha mais rápida, qual seria o caminho mais seguro. Ficou horas tentando resolver essas questões quando resolveu parar e tentar dormir um pouco.
Procurou uma árvore e embaixo dela sentou. Ficou um tempo de olhos abertos observando o céu, quando resolveu dormir. Fechou os olhos, esticou as pernas e levou seus pensamentos para lugares distantes. Logo adormeceu.
O tempo passou e ele começou a sonhar, no início sonhos tranqüilos, mas conforme o tempo passava mais agitados e sombrios eles se tornaram.
Acordou assustado, abriu os olhos rápidos e se deparou com uma figura que o encarava.
- Quem é você? Por que me observa? Não tenho nada de valor, caso queira saber.
Disse ele de forma apressada, e a figura esperou ele acabar de falar e disse calmamente:
- Por muitos nomes sou conhecido, e devo-lhe dizer um deles em breve, se o tempo e a ocasião permitir. Observo-o pois passava por aqui e vi você deitado tendo sonhos irrequietos, e resolvi observar. E o que quero, sim é algo de valor, e sim você o tem. Quero apenas uma informação.
- E qual seria essa informação?
- Gostaria de saber qual estrada pegar.
- Ora veja, se for essa informação perdeu seu tempo, uma vez que eu mesmo não sei qual estrada pegar. E por isso parei aqui e resolvi descansar.
- Não sabe então qual estrada tomar?
- Não!
- Então irei aguardar com você, até que decida qual caminho ir.
- Irá se cansar de esperar, uma vez que eu provavelmente demorarei horas até me decidir.
- Não tenho pressa.
A figura disse isso e sentou de frente para ele.
Horas passaram, a noite já ia bem alta quando ele resolveu levantar, a figura o encarou e disse:
- Escolheu?
- Sim, escolhi meu caminho, após muito pensar decidi que rota seguir.
Disse isso e seguiu em direção ao caminho escolhido.A figura esperou ele se afastar, e continuou olhando para ele até ele sumir do campo de visão. Então ela se levantou e disse:
- Pronto já sei qual caminho tomar, agora sei qual é a escolha certa. É uma pena que ele tenha escolhido o caminho errado, nem pude ao menos dizer-lhe meu nome. Enfim.
Ela deu com os ombros e seguiu o caminho.

terça-feira, 29 de janeiro de 2008

Plínio

Plínio era um cara estranho, caminhava sempre com a cabeça baixa, parecendo pensativo ou apenas alguém que analisa o chão em que pisa. Qualquer um que passasse por ele sentia alguma simpatia pelo grau de introversão que ele demonstrava, talvez estivesse pensando na vida, em planos futuros, na previsão do tempo ou em um jogo de futebol, mas não era isso que ele pensava.

Na verdade, a cada passo Plínio imaginava uma forma diferente de morte para si mesmo, de acordo com o que seus olhos acompanhavam. Ao encostar-se em um parapeito, não conseguia deixar de ver seu corpo se projetando em direção ao vazio, desgarrado até o último e patético impacto em que se transformaria em uma massa disforme. Ao se deparar com um bloqueio policial, sempre visualizava um dos uniformizados confundindo sua aparência com um criminoso e alvejando sua cabeça com uma bala. Sentia a sensação da bala atravessando, de seu carro perdendo o controle e se abrindo em algum poste.

Passava seus dias imaginando a sua própria morte, com curiosidade e criatividade além do desejado, quanto mais alimentava sua morbidade, mais fascinado ficava pela mesma. Tornou-se cada vez mais isolado, arredio ao contato de outras pessoas e menos esperançoso, via a sua morte e com o passar do tempo a morte de outras pessoas ao seu redor, em uma eterna repetição fúnebre.

O mais estranho de tudo é que não havia prazer, imaginava por imaginar, pura e simplesmente, tinha seus sonhos tomados e não conhecia outra forma de pensar ou viver. A cada noite mal dormida, povoada por sonhos estranhos e pesadelos, via como sua mente definhava, suas esperanças morriam junto a sua alegria. Era agora uma casca vazia, um simples projetor de morbidade, alguém que quando fosse finalmente esquecido, seria uma mácula a menos na já tão desgraçada humanidade.

Sobre o demônio

Não existe criatura no mundo mítico mais definida e ao mesmo tempo menos constituída de uma versão final que o Demônio. Explico: vamos pegar o príncipe dos infernos, Lúcifer. Seu nome provém do grego e do latim e significa o portador da luz. Lúcifer foi um dos anjos primordiais, ou seja, um daqueles que estiveram presentes na criação do mundo. Em um dado momento ele voltou-se contra Deus e foi expulso do céu, e assim começa uma das histórias desse ser.
Voltemos a idade média. Lúcifer tinha sua primeira imagem como um anjo sem asas, um ser que caiu em danação e perdeu o direito de entrar no céu. Tudo estaria bem e sua imagem estaria pronta se não fosse o seguinte: os anjos são criaturas belas e a beleza atrai o Homem. Necessitava-se assim de um defeito, e a mente humana, essa brilhante caixinha de produção de óbvios irrelevantes, produziu uma das mais toscas definições do diabo. Como Lúcifer havia caído do céu, pensaram alguns monges medievais, nada mais correto do que durante a queda ele machucasse a perna. Assim produziram um Lúcifer lindo como anjo, porém manco. Pronto, resolveram o problema. Porém alguém comparou a imagem de Cristo, que era representado morto crucificado e a de Lúcifer, bonito, porém manco. Não precisa ser gênio para pensar qual das imagens atraia mais. Dessa forma começou o processo da criação de um mostro. Primeiro associou-se todos as coisas ruins do pensamento medieval à figura de Lúcifer, entre elas os pecados capitais, a mulher e as deformidades físicas. Depois uniram elementos da mitologia grega e romana, tal como o tridente, símbolo de Poseidon. A própria palavra demônio provém do grego Daemon, que quer dizer gênio1. Colocaram também elementos de origem animal, como os chifres de cabra e as pernas de bode. Enfim havia sido criada uma figura que representasse o mal, e que não era nem um pouco atraente.
Não contentes ainda com isso, eles resolveram criar uma monarquia infernal, assim surgiram Belial, Pazuzu, Memphisto, Baal, Duriel, Asmodeus, Andras, Belzebu, Belphegor, entre outros, todos provenientes de religiões consideradas pagãs. Baal, por exemplo, era uma divindade associada ao sol. E o processo de construção dos demônios não parou, vieram ainda outros elementos como as trevas, o fogo, etc. Esse processo ainda existe hoje em dia com a transformação de qualquer coisa em demônio. Até mesmo a coca-cola.

Perdão!?

Geralmente não costumo perdoar! Posso até fingir um certo esquecimento, mas perdoar no sentido extremo da palavra isso não. Perdoar envolve não guardar rancor, olhar o fato e a pessoa que lhe causou mal e não sentir a pontada aguda vingança percorrendo-lhe a espinha deslizando-se por suas veias e artérias esfriando-lhe as juntas e retesando os músculos. Talvez tenha tentado perdoar uma vez, mas não consegui, também ele era um idiota, um cretino, você talvez fizesse o mesmo. Já pensou quantas vezes somos obrigados a tentar perdoar, como nos ensinam sobre o ato divino e glorificante do perdoar. Perdoar não é humano, se fosse não seria assim tão difícil, tão contra a nossa natureza e sim fácil como o respirar, rir e o odiar. Sim, odiar é humano e também natural. Perdoar... ora me perdoem, Não!!!

quinta-feira, 24 de janeiro de 2008

Primeiro Encontro

Cabia a ele a decisão de se aproximar ou não, os sinais já estavam expostos, a troca de palavras era constante mas faltava alguma coisa. Um sinal de que ela realmente estava interessada e pronta para o que ele tinha a oferecer, o que não era pouco. Seus dias se passavam de maneira melancólica nesse ínterim, sem conclusão alguma ou reação nova por parte de ambos.

Tudo só começou a se delinear melhor no encontro que marcaram na quarta feira, onde conversaram de maneira franca sobre temores e inseguranças que acometiam os dois. Entre as palavras o que ficava claro era a forma como ela acompanhava seus olhos, como se tivesse por intenção desvendar algo mais da alma daquele que a admirava. Ele de maneira atabalhoada insistia em mantê-los no rosto dela, o que não conseguia em determinados momentos, devido ao constrangimento de se abrir daquela maneira, acreditava que revelando seus sentimentos enfraquecia, colocando-se a mercê da vontade dela, sentia capaz de ser fulminado com uma negativa.

Ela também, apesar de tudo, se sentia insegura incapaz de entender o que sentia ou poderia fazer, de certa forma curiosa para ver até onde o jogo se prolongaria. Comeram pouco, no nervosismo presente o estômago não era tão receptivo. E ela se perguntou até onde ele tentaria enrolar, postergar, manter a conversa até seu inevitável desfecho.

Ao final do encontro, os dois caminharam pelas ruas, ainda com a distância que a amizade considera segura, sem se tocarem. Tomado pela ansiedade e por se maldizer pela covardia, tentou se aproximar, tendo como desculpa o frio que fazia naquele dia. Tocou as mãos dela para sentir se estavam geladas, e se surpreendeu ao constatar que não estavam. Com uma desculpa a menos para tocá-la, e já temeroso com o final da noite que se aproximava, ficou calado, mudo pelo nervosismo de não saber o que fazer e acompanhar suas chances se esvaindo.

Ela imediatamente percebeu que algo estranho acontecia que sua conversa agora era lacônica e não chegava a lugar algum. Como forma de voltar ao que era antes, ao se despedirem ela lhe deu um beijo terno e quente, próximo aos lábios.

Mal sabia ele que ela agora havia se resolvido, não queria nada, mas manter alguém que massageasse seu ego era oportuno no momento. Ele saiu feliz, acreditando que ainda tinha alguma chance. Ela saiu tranqüila, mais um bajulador junto ao seu séqüito, mais um número a quem ligar quando quisesse que alguém pagasse a conta.

terça-feira, 22 de janeiro de 2008

Cabelos dourados

Cabelos dourados, pele clara, lábios finos e muito senso de humor, era assim que ela me aparecia naquele momento. Não parecia nada constrangida com o sangue coagulado espalhado pela sua face e que dava certo ar cômico à situação. Muito pelo contrário, com um sorriso confiante de quem sabia o que queria ou o que pretendia, ela me fitava.

Naquele período eu trabalhava em um hospital localizado no centro, primeiros anos no exercício de minha profissão e ainda tinha vivido bem pouca coisa, e definitivamente não estava preparado para aquilo.

Ela apareceu sozinha naquele estado, serena e solicitando ajuda, algum acidente havia ocorrido. De imediato, com a malícia inerente à juventude e a vontade de poder ver um pouco mais, me ofereci para o atendimento.

Perguntas de rotina acabaram sem resposta alguma, ela apenas balançava a cabeça de maneira afirmativa ou negativa, imaginei que o ferimento talvez a impossibilitasse de outra forma de comunicação. Disposto a vê-la melhor, me aproximei e toquei sua face, no que ela sorriu com dentes aparentemente brancos, mas tingidos igualmente por sangue. Foi quando ela me beijou.

Língua firme e insaciável, ela me sugava e deixava um gosto férreo e salgado na minha boca. Longe de sentir repulsa, respondi de maneira firme, apertando seu corpo junto ao meu, sem pensar duas vezes. Tomado de desejo e excitado, percebi meus pensamentos se embaralharem e um leve torpor tomar conta.

Quando acordei estava caído no chão, lavado de sangue, meus braços com cortes forneciam e o chão se embebia de vermelho. Meus olhos vermelhos, minha expressão pálida e com o primeiro espelho que encontrei pude constatar, meu rosto manchado com sangue coagulado e meus dentes tingidos de sangue como se minhas gengivas estivessem abertas.

sexta-feira, 11 de janeiro de 2008

Um último trago

Hoje, em um dia como outro qualquer, permaneço aqui na plataforma do metrô aguardando a sua chegada. Tenho como companhia o calor abafado do verão e os excrementos de pomba que cobrem algumas partes do chão. Paro e penso sobre como as coisas se modificaram, os anos se passaram e a vida se tornou mais complicada. Nesses momentos de maior introversão e reflexão, ainda levo meus dedos à boca frequentemente em busca de um trago inexistente, é um hábito que adquiri ao deixar de fumar.

Os trens do metrô se revezam a minha frente, carregando dezenas de pessoas de um lado para o outro de maneira continua e rotineira. Acompanho cada um de seus vagões e observo as pessoas que entram e saem a cada minuto, sem saber o que esperar. Dentro deste tédio rotineiro talvez cada uma delas guarde uma fagulha de algo, seja bom, ruim, triste ou feliz, com histórias perdidas que talvez tivessem me dado entretenimento por alguns minutos ao menos. Pensamento egoísta mas é tudo o que posso oferecer.

Cansado de ficar em pé busco uma cadeira que vejo ocupada por um verme que despreocupado anda de um lado para o outro, parece mais animado do que eu. Decido permanecer em pé e pensar no que vou escrever ao chegar em casa, passa pela minha mente a possibilidade de escrever contos autobiográficos que refletem parte do que vivi nos últimos tempos ou lembranças da infância. De certa forma descarto a primeira opção, preocupado com o que outras pessoas podem falar e me decido pelo segunda, com imagens bem pouco sutis mas que realmente me marcaram.

A noite quente me faz pensar nos benefícios de estar em casa, de descansar, de por um fim em certas coisas, ver-me livre de devaneios e estranhamentos que guardo em mim. Percebo que irei fracassar pateticamente, as fiandeiras continuam seu trabalho, sei que a maior parte do que posso decidir não terá impacto nenhum.

Após longos minutos me pego uma vez mais com os dois dedos esticados, simulando um trago. Realmente não sei o que fazer.

quinta-feira, 10 de janeiro de 2008

Desafio aceito

Armando era um cara legal, desses com quem você pode passar uma noite inteira conversando sobre amenidades, sem perder o interesse ou sentir-se entediado. Trabalhava em uma pequena loja de brinquedos, das poucas que ainda restavam pela cidade, 10 horas por dia, em uma labuta sem fim. Sua ocupação fora da loja era beber sentado em qualquer botequim, colecionar selos e pintar.

Nos últimos 5 anos mudou de companhia regularmente, poucas eram as que agüentavam suas manias, indecisões e paixões. Explicar a uma mulher o motivo pelo qual tinha praticamente dobrado o turno na véspera do natal e em seguida encontrar-se com os amigos para uma boa cerveja, tinha sido o fim de seu último relacionamento. Contudo, continuava esperançoso e feliz, aguardava de forma paciente por uma nova oportunidade, uma nova mulher para tornar seus dias mais doces.

Ao final de mais um dia de trabalho quase ao encerrar seu expediente, uma última cliente se aproximou do caixa. Era de estatura mediana, cabelos dourados e sorriso perfeito. Armando de imediato não deu grande importância para ela, estava com a cabeça ocupada demais com preços, estoques e outras tantas coisas. Mal humorado, tratou-a de forma seca e áspera mesmo que sem intenção. Ela como resposta apenas olhou em seus olhos de forma terna e sorriu, Armando simplesmente desabou.

Incapaz de manter sua concentração e atordoado por aquela visão começou a gaguejar e por mais que ela repetisse milhares de vezes que seu nome era Laura, ele parecia não entender... Não que ele não entendesse o nome, só não conseguia compreender como alguém tão bela e maravilhosa podia ser chamada de forma tão simples: Laura.

No momento de pagar sua conta ela retirou sua carteira e seu cartão de crédito da bolsa e nesse momento ele se sentiu constrangido. Fez o pacote, colocou uma fita na caixa da boneca que ela havia comprado e se desculpou de maneira constrangedora pelo tratamento anterior. Meio sem jeito, Laura o desculpou e ficou sinceramente impressionada com os olhos do rapaz, de uma sinceridade e meiguice que ela considerou irresistíveis.

No caminho para casa ela se recordou por diversas vezes de Armando, ele parecia tão atrapalhado naquele momento que não tinha dito seu nome a ela, mas é para esse tipo de coisa também que serve um crachá. Com seus passos meio perdidos e cabeça no mundo da lua, ela tinha se esquecido que estava atrasada. Acelerou o passo enquanto corria para o metrô, carregando seu pacote e suas coisas rumo a festa de aniversário de sua sobrinha.

No dia seguinte, a caminho do escritório, ela se olhava no espelho do elevador - cabelos presos em um coque, meia fina, salto baixo e Tailleur, sentia-se impecável. Sorriu para si mesma e passou a manhã inteira com a lembrança de que algo, ou melhor, alguém tinha surgido para ela no dia anterior. Quando estava perto da hora do almoço pensou em como gostava muito de sua sobrinha e como talvez mais um presentinho fosse deixá-la tão contente e a ela própria também.

Laura era advogada, solteira e capaz de contar nos dedos de uma só mão a quantidade de vezes que havia se interessado realmente por alguém. Vivia sozinha em um pequeno apartamento com suas flores. Amava mais do que tudo a liberdade que tinha e procurava mantê-la a todo custo, e por conta disto seus últimos relacionamentos haviam naufragado. Sabia-se bonita e por diversas vezes se utilizava dessa beleza para que portas fossem abertas, pneus trocados, pintura nova, entre outras coisas. Mas nos últimos tempos sentia-se triste, a solidão e a falta de perspectiva amorosa a tinham tornado mais apática, esta era sua chance de mudar.

Ao entrar na loja, ficou decepcionada ao perceber que era outro vendedor que atendia, que Armando não estava ali, ao menos aparentemente. Quando já se preparava para sair, viu seu objetivo sair atrapalhado do estoque, carregado com mil caixas diferentes e com um sorriso bonachão. Mal sabia ela que na verdade ele estava se relembrando do dia anterior.

Armando mal dormira aquela noite, tinha saído da loja pensando em alguma forma de entrar em contato com ela, só não sabia como. Usar o cadastro da loja para ligar para alguém parecia insano, o vexame de que ela não se lembrasse dele ou da loja, até mesmo a falta de um sinal por parte dela de interesse, tornavam proibitivas quaisquer formas de contato. Mas logo ele a viu lá, e seu coração disparou.

Os dois estavam meio constrangidos ao se cumprimentarem, pareciam de volta ao terreno da insegurança adolescente. Ele a ajudou a escolher outra lembrança para a sobrinha, sem desgrudar seus olhos dela ou de alguma parte que a pertencia por um segundo que fosse. Também fez questão de examinar com atenção a mão da bela, na tentativa de conferir se alguém já fazia parte de sua vida, o que aliviado percebeu não ser o caso. E como ela era linda: olhos cativantes e claros, mãos com dedos delicados e finos, boca perfeita, com lábios carnudos mas sem excesso.

No momento em que ela se preparava para sair, ele tomou toda a coragem que ainda existia em seu corpo e se preparou para fazer um elogio, prosseguir em uma tentativa de flerte, qualquer coisa, só para ver seu coração diminuir o ritmo ou sair pela boca de vez. Ao mesmo tempo Laura queria dizer alguma coisa, apesar de temerosa de parecer vulgar, oferecida ou qualquer coisa do tipo. Armando comentou alguma coisa sobre como ela era bonita e por algum motivo que mesmo ele ignorava acabou com as bochechas coradas. Laura achando tudo aquilo terno, tentou dar prosseguimento ao assunto, falando sobre amenidades que vinham a sua cabeça, fitando com verdadeiro interesse os olhos dele. Armando contando com mais confiança graças a isso, pediu seu telefone, no que foi atendido. Pronto, estava feito!

Saíram duas noites depois para jantar, ela escolheu o lugar e isso causou certo constrangimento a Armando, que estava muito mais acostumado com mesas de bar. Ele havia tentado caprichar no visual: usava calça bege, camisa preta e sapato – coisa que o fez se sentir desconfortável por conta do costume de usar apenas seu bom e velho par de tênis. Ao chegar ao restaurante, Laura sentiu o desconforto de seu par e preocupada passou a tentar torna-lo mais relaxado, o que conseguiu graças ao tom doce de sua voz.

Comeram, conversaram, riram e se divertiram por horas, encantados um com o outro. Tinham pouco em comum e era por conta disso que se fascinavam ainda mais, Armando se surpreendia com a firmeza e ambição daquela mulher, ao mesmo tempo em que Laura se encantava com seu jeito despojado.

(Continua)

quarta-feira, 9 de janeiro de 2008

Uma noite em um bar

Com o fim de mais um dia e o início de uma nova noite, comecei a ficar inquieto. A agitação e minhas inquietudes tinham nome, mas deixei para lá. Na esperança de espairecer e tranqüilizar meus pensamentos, caminhei por ruas e avenidas. Passei de forma rápida por shopping centers, lojas desarrumadas e botecos sujos, perdidos.
Após horas de caminhada encontrei um lugar onde descansar. Rapidamente sentei-me na mesa da calçada, no intuito de ver um pouco do que a vida ainda oferece. As horas se passavam com a minha tentativa sistemática de analisar cada um dos que passavam por mim, com especial cuidado com as mulheres. Loiras, morenas, ruivas, negras e asiáticas, uma a uma elas se revezavam passando pela frente da minha mesa. Não que eu fosse propriamente um imã de mulheres, mas é que minha mesa ficava bem no caminho dos demais passantes.
Após a empolgação inicial, o tédio começou a se alastrar, observar mulheres bonitas em uma eterna procissão, com suas bundas empinadas, saltos e vestidinhos decotados, já não me satisfaziam. Saquei de meu celular e comecei a pesquisar os números da agenda. Pessoas que não via, que eu havia me esquecido, pessoas ternas, idiotas ou simplesmente substituíveis se alternavam no meu visor.Passei a meia hora seguinte pensando em cada uma delas, como parte do que sou, das pequenas histórias da minha vida que contaram com a participação daquelas pessoas.

Cansado desta nova invenção, com a bexiga cheia e desesperado por um banheiro, retirei-me de minha mesa com todo cuidado - quando se está sozinho não costuma ser aconselhável deixar seus pertences por aí. Caminhei de forma engraçada, ao menos para os que me acompanhavam, pernas dançando como se uma ventania tivesse tido origem dentro do bar.
Entrei no banheiro, caminhei até o mictório e apoiei minha mão na parede. Para ser sincero, fiquei inconformado com a quantidade de pôsteres de mau gosto que vi, macacos sentados em pinicos, outros mostrando as gengivas com pose de caçador, em suma, mal gosto diabólico que acabou dando “neura” em mim que já estava trêbado.
Dever cumprido, retornei a minha mesa. Agora era a hora de recarregar as baterias, colocar fim na bebedeira, afinal minha mulher me aguardava em casa. Pedi ao garçom uma coca e a coisa mais engordurada, nojenta e ultrajante que existia naquele cardápio sujismundo. Quando meu prato chegou, comi com voracidade, sentindo cinco anos da minha vida morrendo, minhas artérias se entupindo e a sensação de que meu tubo digestivo recebia graxa ou qualquer outro lubrificante graças ao meu quitute. A coca era a única coisa agradável, tinha chegado no ponto que eu gosto, sem estar estupidamente fria.

Finalmente levantei, passos lentos e ruidosos, acompanhado apenas pela luz dos postes acima de mim. Caminhei com segurança apesar de tudo, na minha cabeça a única coisa que eu tinha para ter perdido já se fora. Ao chegar, abri minha porta, com a sapiência de colocar o dedo ao lado do buraco da fechadura, como forma de não errar o buraco – é, eu ainda estava bêbado -, tirei os sapatos, com um passo após o outro com o máximo de cuidado possível.

Passados quinze minutos e após vistoriar cada um dos quartos, percebi que estava sozinho, quem quer que tenha existido por lá, já havia saído há muito tempo.

terça-feira, 8 de janeiro de 2008

Disney Fantasia The Sorcerer's Apprentice

Origem do nome.

Apólogo:
[do grego apólogos, do latim apologu]
narrativa em prosa ou verso, ger. dialogada, que encerra uma lição moral, e em que figuram seres inanimados, imaginariamente dotados de palavra.